Sobre Necy Araújo Fortes - minha mãe

30/03/2015 20:00

No dia 27 de março deste ano, minha mãe recebeu uma linda homenagem na 5ª edição do Prêmio Selma Bandeira, realizado no auditório da Casa da Indústria em Maceió - AL, por sua trajetória de luta, dificuldades e conquistas, no sertão alagoano. Clique para vocês poderem ler um breve histórico de sua vida.

 

Nascida em 15 de agosto de 1939, no município de Mata Grande, sertão alagoano, filha de agricultor, Necy Araújo Fortes, mesmo diante de todas as dificuldades comuns ao sertão nordestino, conseguiu concluir seus estudos de forma plena ao ponto de, aos 16 anos, estar habilitada como professora primária.

Aos 20 anos casou-se com Genivaldo Constante Rocha, também agricultor da região, motivo pelo qual se afastou do ensino primário e passou a cuidar da casa, recolhendo em seu coração o desejo de voltar a ensinar. Logo vieram os filhos, seis meninas e um menino, que fizeram com que esse desejo fosse, em parte, realizado. Dona Necy, como é conhecida na região, começou a alfabetizar seus filhos em casa, fazendo com que todos mantivessem o primeiro contato com as letras e números no aconchego do lar, antes mesmo do início da vida escolar.  Porém, aquele desejo guardado em seu coração precisava de mais, foi então que se tornou professora do extinto Mobral, levando leitura e conhecimento aos adultos da região, sempre à luz de um lampião a gás. Por anos D. Necy atuou firmemente com o propósito de reduzir o número de adultos analfabetos nas cercanias do Sítio Encruzilhada, sua residência até hoje, sendo este um dos vários motivos que a fizeram ser admirada e respeitada por alunos, amigos e vizinhos.

Residente no Sítio Encruzilhada há 75 anos, além de criar os filhos, cuidar da casa e alfabetizar adultos, D. Necy também atuou, em várias oportunidades, como parteira em sua própria casa. Por vezes atendeu gestantes que, por dificuldades financeiras ou por não poderem mais esperar, não tiveram a possibilidade de dar a luz em um hospital ou maternidade. O Sítio Encruzilhada presenciou inúmeros partos, realizados sempre com a mão forte, segura e carinhosa de D. Necy. Trazer tantos bebês à vida fez com que, entre outros motivos, ela se tornasse madrinha de muitas crianças da região. Na sua última contagem, enumerou por volta de 140 afilhados.

D. Necy também teve sua fase de pequena empresária, ou de negociante, palavra mais apropriada ao linguajar local. Por algum tempo, vendeu retalhos no povoado de Manari, hoje município de Pernambuco. Com isso, ajudava nas despesas do lar e nas despesas para atender a vaidade de suas seis filhas.

Hoje, D. Necy não atua mais como professora, tampouco realiza partos. Não porque a idade não permita ou porque o corpo e a mente não consigam mais realizar essas tarefas, isso se deve ao fato de que houve evolução no acesso à educação e à saúde, principalmente se confrontadas com as condições das décadas de 60, 70 e 80. Suas mãos continuam firmes e seguras, ainda trabalhando na agricultura, ainda cuidando da casa, ainda cuidando da família, principalmente de sua neta Ana Mell, de 7 anos, que veio para fazer com que D. Necy revivesse a criação de seus filhos. Suas mãos carinhosas continuam a cuidar do lar, preparando-o para receber seus filhos, seus netos, bisneto, parentes e amigos, sempre acompanhadas de um largo e belo sorriso, marca característica de uma sertaneja forte, como seu próprio sobrenome diz.